Esporte que mais oferece medalhas em Pan-Americanos (138), o atletismo
tem percorrido as duas mãos do processo de "troca-troca" de atletas
entre modalidades.
Famosas por serem a base das atividades físicas, as pistas estão
deixando de ser apenas fornecedoras para passar também a consumir
promessas.
"O Brasil ainda tem algumas deficiências de desenvolvimento no
atletismo. Somos famosos nas provas de velocidade, de fundo, mas ainda
estamos cavando o espaço nas de campo", diz Martinho Nobre dos Santos,
secretário-geral da confederação.
É exatamente nesse vácuo -eventos como lançamento de martelo, dardo,
peso e salto com vara- que estão se encaixando atletas que passaram a
ver um horizonte promissor no atletismo.
Após passar mais de dez anos dando piruetas ao lado de nomes como
Daiane dos Santos e Daniele Hypólito, Karla da Silva, 20, viu que
precisava de novos rumos.
Alta para o esporte -1,67 m-, ela sofria com lesões constantes, que a
impediram de buscar vaga na seleção de ginástica e a obrigaram a ter o
pé duas vezes operado.
"Mas eu não queria parar com esporte de jeito nenhum", conta.
A idéia foi treinar atletismo duas vezes por semana e ginástica
artística outras três, mas só para não deixar o corpo parado. Até que
o técnico Elson Miranda a viu em ação e fez o convite.
"Quando vi o que ia fazer, tive medo. Achava que eu ia cair, era muito
alto", diz Karla, hoje segunda colocada do ranking brasileiro e
recordista sul-americana sub-23 de salto com vara.
A ginástica, no entanto, segue em sua rotina. Os atletas usam os
movimentos do esporte para ganhar força nos membros superiores e
melhorar a capacidade acrobática, necessária para o salto.
"Quem já tem isso na bagagem possui maior apuro técnico. Você só
precisa ensinar a técnica da corrida", diz Miranda, que já havia
resgatado outra ginasta dos tablados, Fabiana Murer, 24, recordista
brasileira do salto com vara.
Na outra mão do processo, atletas que não vislumbravam mais sucesso no
atletismo estão aproveitando a base que construíram para se arriscar
em outros esportes, muitos tapando grandes lacunas para o Pan de 2007,
como, por exemplo, os novos destaques do levantamento de peso.
A antiga velocista Aline Campeiro percebeu que não teria futuro nas
pistas quando alcançou a categoria juvenil -havia sido campeã
sul-americana menor.
A atleta ficou quase dois anos parada até ser levada pelo técnico
Carlos Henrique Aveiro, o Saul, para ver demonstração de levantamento
de peso. Apaixonou-se.
"Eu sempre gostei mais da parte física do treino de atletismo do que
da corrida. E sempre peguei bastante peso", relembra.
Aline, 24, já foi campeã brasileira e igualou o recorde de arremesso
(um dos movimentos da modalidade; o outro é o arranque) de Maria
Elizabeth Jorge, com 80 kg na categoria até 48 kg -ergueu 80,5 kg, mas
o regulamento só conta de quilo em quilo. Nona colocada em
Sydney-2000, Maria Elizabeth obteve o melhor resultado de atletas
brasileiros na modalidade em Olimpíadas.
"O que eu consigo no levantamento, jamais conseguiria no atletismo.
Todos os índices que me propuseram até hoje, eu fiz. Até 2007, estarei
fazendo muito mais", diz Aline, que também deixou as pistas por causa
do biótipo. Com apenas 1,48 m, é baixinha demais para os 100 m rasos.
Liliane Meneses, sua companheira de esporte, começa agora a largar o
atletismo. A levantadora de peso de 20 anos vai se dedicar ao esporte
de origem -lança martelo e peso- apenas para garantir uma bolsa na
universidade.
No fim do ano, também continuará a se aventurar no bobsled (esporte de
inverno, no qual se emprega um trenó). Ela é atual campeã
sul-americana de levantamento de peso juvenil em arranque, arremesso e
total. "Eu me adaptei facilmente e tenho obtido bons resultados. Acho
que tenho 99% de chance de estar muito bem no Pan."