frustrações. Porém, tenho sofrido muito mais com as colocações
absurdas de certos comentaristas esportivos.
De uns tempos pra cá, começaram a perceber que um dos maiores
problemas de nossos atletas é a falta de equilíbrio emocional para
lidar com competições de alto nível. Só que, em vez de se investir na
solução do problema, contratando bons profissionais para isso,
começaram a surgir avaliações extremamente equivocadas.
Quando um atleta consegue se sair bem na competição, é elevado à
categoria de herói. Quando não, é considerado um fraco, defeituoso,
uma pessoa sem "força mental" (foi exatamente esse o termo que ouvi).
É um grande erro pensar que equilíbrio emocional seja um traço de
caráter, algo com o qual se nasce ou não. É como se o atleta tivesse
uma grande obrigação de nascer bem preparado.
É claro que nascemos com tendências biológicas, mas elas só se
efetivam na relação com o meio. A chamada "força de caráter" é algo
que se desenvolve dentro de contingências sociais e culturais. Por
mais condições de campeão que o Phelps tenha, suas habilidades
emocionais são sistematicamente treinadas e acompanhadas.
Se considerarmos a realidade dos países latino-americanos, estamos em
supremacia no quadro de medalhas. As 14 medalhas que já conquistamos
nos colocam em situação melhor que Cuba, uma grande potência esportiva
no passado. Nossos colonizadores europeus amargam somente duas
medalhas. Abaixo de nós estão também a Suíça, a Suécia, a Bélgica, e
até os donos do berço das Olimpíadas, a Grécia. Se isso poderia
aumentar nossa auto-estima, a comparação com países como Estados
Unidos e China pode nos deixar muito inseguros.
O Brasil precisa desesperadamente de medalhas para provar a si mesmo
que não é inferior aos outros países. É como alguém que precisa
loucamente de um namorado para acreditar que merece receber amor; com
tanta ansiedade, é complicado não meter os pés pelas mãos.
Quando assisti às provas da ginástica artística feminina, duas coisas
me chamaram a atenção. A primeira foi a americana que caiu em dois
aparelhos, tirando o ouro dos Estados Unidos por equipe, e acabou
sendo campeã no individual geral. Para mim, isso é uma evidência de
que falhar é uma possibilidade humana, até para atletas de equipes
acostumadas a bons resultados como a americana. Mas mostrou também que
uma atleta com auto-estima alta pode assimilar uma derrota sem se
deixar abater, dar a volta por cima e subir ao pódio. Perde-se uma
medalha aqui, ganha-se outra ali.
Outra lição veio do Japão. Com muita humildade, as pequenas atletas
comemoraram intensamente a subida do oitavo para o quinto lugar como
se tivessem ganhado uma medalha de ouro! Cada atleta que completava
bem sua série era saudada calorosamente pela equipe, que chorou de
alegria por ter melhorado em três posições sua classificação no
resultado final.
Da equipe nipônica, gravei também o sorriso das meninas. De acordo com
a Psicologia Comportamental, ou Behaviorismo, nossos comportamentos
são mantidos por dois tipos de conseqüência: reforço positivo ou
reforço negativo. Colocando de forma simplificada, no primeiro caso o
comportamento é seguido de algo agradável à pessoa e, no segundo, é
seguido da retirada de algo desagradável. Em outras palavras, tanto o
prazer quanto o alívio podem servir de reforço para os comportamentos.
No caso do Brasil, quando Daiane dos Santos dá graças a Deus ao
terminar a série, e Jade Barbosa entra com uma expressão de desamparo
em cada aparelho, só se pode inferir que não há prazer na realização
dos exercícios. A ansiedade pré-competição é desagradável sim, mas é
triste que ao final só reste alívio. A alegria de estar ali parece não
ter sido vivida em sua plenitude.
Daí, chegamos a outro dado. A satisfação em realizar seu melhor
desempenho é a conseqüência mais imediata de competir. Esse deveria
ser o foco, sempre. A medalha é uma conseqüência posterior que, se
estiver no foco do atleta, desconcentra e atrapalha o resultado final.
Quando um Brasil inteiro coloca a medalha no peito de um garoto como
Diego Hypólito de forma tão antecipada, em vez de ajudar, atrapalha o
atleta.
Nossos pensamentos estão interligados às emoções e ao desempenho.
Pensar na derrota ou na iminência de medalha são duas formas
diferentes de deslocar o indivíduo do momento da competição: momentos
curtos e decisivos, que acontecem somente de quatro em quatro anos.
Quem não esteve lá totalmente presente, terá que esperar mais quatro
anos para, talvez, conseguir viver o momento da próxima vez.
Enfim, a vitória da seleção feminina de vôlei é uma vitória da
Psicologia do Esporte. Com uma psicóloga bancada pelo técnico José
Roberto, a seleção conseguiu superar o drama da última olimpíada.
Nem o sorriso arrogante das americanas conseguiu desbancar as
brasileiras, que mostraram sua melhor performance. Não houve desânimo
quando estavam atrás no placar, nem comemoração antecipada. Elas
estavam inteiramente presentes na quadra, vivendo somente aquele
momento, e agora podem viver plenamente o momento de comemoração.
Parabéns à psicóloga e ao José Roberto, que em vez de ver suas meninas
como defeituosas por não terem nascido preparadas, entendeu aquilo que
o Comitê Olímpico Brasileiro já deveria ter feito em todas as
modalidades: emoção é comportamento que tem que ser tão treinado
quanto os movimentos dos atletas.
Publicada em: http://monicavalentim.blogspot.com/