Se os miseráveis caminham para a completa extinção, se os pobres não
param de subir na vida, se o PAC vai deixando o Brasil com cara de
Califórnia, se até um Paraguai se sentiria autorizado a gastar por
conta caso dispusesse do colosso de petrodólares guardado no pré-sal,
não faz sentido tisnar a imagem do país no Exterior com a mancha da
sovinice. Agiu bem o presidente Lula, assim, ao declarar em Pequim que
"fazer no Rio a Olimpíada de 2016 não tem preço".
"Se você escolher qualquer assunto, qualquer tema, o Brasil estará
entre as dez maiores economias do mundo", ofegou, ainda convalescendo
da animada performance na festa de abertura. "Temos, portanto, o
direito de reivindicar o que quisermos". A Copa de 2014, por exemplo,
já é nossa – e vai sair praticamente de graça para os contribuintes,
já esclareceu Ricardo Teixeira, presidente da CBF e, por extensão, do
País do Futebol.
A construção de um punhado de estádios, a reforma de alguns e outras
providências consumirão mais de R$ 10 bilhões, certo. "Mas essa Copa
só pode ser feita pela iniciativa privada", acalmou Teixeira,
confiante na enxurrada de contratos que ainda não exibiu a primeira
gota.
Vai sobrar para o governo, claro. E o governo vai espetar a conta no
bolso dos que pagam impostos, claro. Mas Lula não está para miudezas.
É homem que pensa grande, enxerga longe. Tanto que já pode descrever
as emoções reservadas pelos Jogos de 2016 aos pobres que restarem no
país e aos que seguirão abundantes na América do Sul.
"Temos fronteira seca com vários países", ensinou geografia ao
repórter da rádio BBC. "Os pobres que não têm chance de ver uma
Olimpíada poderão ir ao Brasil ver uma". Na China, por exemplo, a
representação da Bolívia limitou-se aos seis atletas. Se aparecerem no
Rio, terão o apoio de muitos milhares de compatriotas desvalidos.
Lula contempla os US$ 40 bilhões (cerca de R$ 64 bilhões)
desembolsados pelo governo chinês com a displicência de quem ouve
quanto custa uma tapioca. "Não se deve olhar apenas quanto custa uma
Olimpíada", advertiu. "Temos de ver também os benefícios esportivos
que isso traz e os investimentos em infra-estrutura".
Qualquer semelhança com a discurseira que precedeu, acompanhou e hoje
tenta justificar certos mistérios do Pan-2007 nada tem de
coincidência. É reincidência mesmo. De novo, Lula endossa sem conferir
cálculos escancaradamente irreais. Os Jogos do Rio deveriam custar R$
414 milhões. Engoliram R$ 4 bilhões. O Engenhão, por exemplo, não
passaria de R$ 60 milhões e seria depois entregue à população carioca.
Custou R$ 400 milhões e foi alugado a preço de ocasião ao Botafogo.
O projeto incluía o Veículo-Leve Sobre Trilhos Barra-Galeão, a Linha 4
do Metrô Barra-Botafogo, a ligação hidroviária Barra-Centro, a
despoluição de todas as lagoas e outros sonhos. Pois o presidente do
COB, Carlos Nuzman, enfeitou o projeto olímpico com as mesmas miragens
e promete cumprir as promessas pela módica quantia de R$ 6 bilhões.
Apenas R$ 1 milhão acima do custo do Pan.
Na Casa Brasil, montada em Pequim pelo governo e pelo COB, foram
enterrados R$ 3.598.103,92. A precisão da conta trai a mão de quem
economiza centavos para fazer de conta que não está pensando em
comissões milionárias.