O Treinamento de força para os corredores ainda gera polêmica entre atletas e treinadores. "Ao falarmos de musculação, o que nos vem à cabeça é aquela pessoa forte que não pratica nenhum tipo de exercício aeróbico, mas, contradizendo totalmente o mito que corredores não podem praticar treinamento de musculação, agora é provado que o treinamento de força é mais do que necessário para esse tipo de atleta", aponta o professor e personal trainer da Academia Reebok Sports Club e pós-graduando em bases nutricionais para atividades físicas Eric Mélhem Haddad.
"Há algumas décadas, trabalhávamos no Brasil com alguns mitos, em que não se permitia exercitar certas valências físicas para determinados grupos de provas. Um exemplo: para fundistas, não havia necessidade de força e muito pouca coordenação e flexibilidade.
No caso específico da força, era um crime executar esse trabalho para a terceira idade e, há bem pouco tempo, foi apresentado na televisão um programa destinado à terceira idade, em que se apresentavam as vantagens de um trabalho de força para a faixa etária. É óbvio que, tanto para a terceira idade quanto para os corredores de longa distância, não estamos falando de força máxima", intervém Adauto Domingues, técnico do medalhista pan-americano nas provas de 5 mil e 10 mil metros Marilson Gomes da Silva.
Para Domingues, depois dos avanços do treinamento desportivo e da fisiologia do exercício e de outras áreas que trabalham conjuntamente, foi permitido ampliar esse projeto dentro dessas valências para atingir resultados de alto nível técnico mais cedo e, com certeza, também uma maior longevidade de nossos atletas.
"O que deve ser entendido é que força pode e deve ser trabalhada de várias formas e métodos, ou seja, de maneira geral e específica. Não entenda força apenas como aqueles exaustivos trabalhos de três a quatro horas em salas de musculação", justifica Domingues.
O treinador ainda revela que seu atleta Silva é um exemplo no trabalho de musculação. "Melhoramos muito e sabemos que ainda é uma deficiência na qual temos de nos empenhar para solucionar."
Ao longo do ano, Silva realiza várias sessões de treinos na sala de musculação, trabalhando, no início da temporada, principalmente a resistência muscular localizada e séries em rampas, com inclinação entre 35º e 40º. Mais adiante, nos treinos, diminui essa inclinação para aproximadamente de 25º a 30º, fazendo com que ele possa correr mais próximo de seu estilo de corrida normal, e ainda faz exercícios de coordenação em uma distância maior do que o habitual, próximo de 100 metros para os fundistas e de 120 a 130 metros para os meios-fundistas, que podem ser feitos na areia, trabalhos em forma de circuito e exercícios com medicine ball.
"Esses exercícios precisarão ser avaliados para sabermos individualmente o que está sendo trabalhado com determinado atleta de acordo com a condição atual e com o tipo de carga. Para alguns, pode estar atacando a resistência muscular localizada, para outros não", expõe Domingues.
O treinador é enfático em sua conclusão: "O componente da força dentro das qualidades físicas básicas é tão importante quanto resistência, velocidade e coordenação. Até porque elas se completam e a fraqueza de uma pode estar relacionada com a deficiência da outra. Tão importante quanto o conhecimento é o bom senso".
Benefícios
São inúmeros os benefícios para o corredor quando ele inclui musculação em seus treinamentos. "A necessidade é cada vez maior, pois muitos deles precisam parar de fazer seu treinamento de corrida por causa das lesões nos músculos e nas articulações, que certamente poderiam ter sido evitadas com a realização de um treinamento de força adequado", admite Haddad.
Os benefícios da musculação para os corredores não param por aí. "Além de evitar lesões, esse tipo de treinamento não deixa que os tendões do músculo fiquem sobrecarregados, evitando a temida tendinite, e também faz com que o atleta se sinta mais confortável durante a corrida", afirma Haddad. Com o músculo mais fortalecido, a necessidade da demanda de oxigênio para o mesmo se torna menor e, como conseqüência, seu coração precisa trabalhar menos e de maneira mais eficiente.
Fibras musculares
De acordo com o professor Haddad, o músculo se divide basicamente em dois tipos de fibras musculares: fibras do tipo I e do tipo II. Elas são comumente chamadas de fibras vermelhas e brancas, respectivamente.
"A primeira se caracteriza como uma fibra de contração rápida e vigorosa, utilizada em exercícios físicos de curta duração e grande intensidade; já a segunda é oposta à primeira e se caracteriza como uma fibra de contração lenta para exercícios de longa duração e baixa intensidade, em que predomina a resistência muscular", informa Haddad.
Apesar de as fibras lentas serem predominantes para corredores de longa distância, como provas acima de 6 quilômetros, as fibras de contração rápida também são bastante utilizadas dependendo do tipo de prova, como nas provas em que existem subidas muito inclinadas, quando um atleta tem de aumentar a velocidade para ultrapassar outro corredor, e também na reta final de uma competição, quando o atleta dá o máximo de si para aumentar seu desempenho.
"Portanto, o treinamento de força para atletas de endurance tem uma importância muito maior do que as pessoas imaginam, e quando citamos atletas de endurance estamos falando de provas que podem durar até quatro horas, incluindo aí principalmente atletas de corrida, ciclismo, natação e triatlo", conclui Haddad.
Volume
Como o treinamento para atletas de endurance tem um volume muito grande durante o dia, principalmente entre os triatletas, é necessário que o trabalho de força tenha o volume e a intensidade adequados com o tipo de atividade que o atleta fez no dia.
"Se um corredor realizou um treino de tiro no dia, é preciso estar atento para que o atleta não faça o treino de força para a região dos membros inferiores, pois as fibras musculares trabalhadas na corrida são as mesmas a serem movimentadas durante o treino de força, podendo sobrecarregar músculos e articulações envolvidos na corrida, não havendo tempo para que o músculo se recupere da atividade", pondera Haddad.
No entanto, o professor explica a necessidade de realizar musculação de forma organizada e planejada por um profissional competente, buscando periodizar de acordo com a atividade do atleta.
"Apesar de um atleta de endurance estar num nível avançado em sua atividade, não quer dizer que ele esteja apto a fazer um treino avançado na musculação, pois no treinamento trabalha-se com sobrecarga, em que a atividade que o indivíduo faz é suportar uma carga que seu corpo não está acostumado a carregar no dia-a-dia, daí então a necessidade de o músculo se adaptar àquela carga, passando a estar em constante adaptação fisiológica", ensina Haddad.
Mesmo um atleta de um nível avançado em provas de endurance precisa começar o treinamento de força em um nível iniciante, e o tipo de treino já se adequará ao tipo de estímulo predominante para provas com essas características, que são os exercícios de resistência de força, em que são utilizadas de 15 a 20 repetições basicamente, com a necessidade de trabalhar todas as regiões dos membros inferiores, sendo os principais a parte anterior da perna (quadríceps), os adutores, os abdutores, a parte posterior da perna (isquitibiais), os gêmeos (panturrilha) e o tibial anterior da perna, que é importante principalmente para os iniciantes.
Iniciantes
Os iniciantes devem abusar dos aparelhos, porque o indivíduo trabalhará também seu sistema neuromuscular e melhorará sua coordenação motora, automatizando os movimentos que ele executará, com um volume de treinamento pequeno (treino mais curto), com os exercícios descritos a seguir.
Intermediários
No nível intermediário, é necessário aumentar o volume de treinamento, em que o grau de complexidade dos exercícios também se eleva. Através do primeiro treino, o indivíduo melhora e muito sua coordenação nos movimentos.
Avançado
O volume do treino e o grau de complexidade dos exercícios aumentam novamente. Nesse tipo de trabalho, é importante observar a importância de utilizar exercícios para os membros inferiores de maneira que não seja preciso usar a articulação do joelho para que ela não fique sobrecarregada, como é o caso do Stiff.
"Também nesse nível é preciso estar mais atento à periodização aplicada ao praticante, pois é necessário que na musculação haja o trabalho de supercompensação do músculo, em que ele recebe um tipo de estímulo durante determinado tempo (medido por semanas) e posteriormente recebe outro estímulo a fim de que haja uma recuperação metabólica muscular adequada; então, terá a capacidade de suportar um volume e uma intensidade de treino mais elevados", mostra Haddad.
Fases da musculação
É importante salientar que os exercícios de musculação têm duas fases: a fase concêntrica (momento de contração do músculo) e a fase excêntrica (momento de extensão do músculo), e a maior adaptação que o músculo sofre é nessa última fase. "Nesse momento do exercício, é preciso executar os movimentos de forma mais lenta do que na fase concêntrica", ensina Haddad.
Na corrida, por exemplo, quando o atleta se encontra numa descida, a perna se fadiga de forma muito fácil, sobrecarregando as articulações e os quadríceps, pelo fato de a perna se encontrar num trabalho excêntrico, se colocando da forma contrária a que eles estão acostumados a trabalhar .
Descrição dos movimentos
| Dorsiflexão ? Com os joelhos estendidos e a coluna estabilizada, faça a flexão e a extensão total da articulação do tornozelo. |
| Adução ? Com a coluna sempre apoiada, execute a adução (abrir) e abdução (fechar) completa até o alongamento total dos músculos da parte interior da perna. |
| Leg press 45º ? Coluna bem apoiada no encosto, pé, joelho e quadril formando um ângulo de 90º durante a execução do movimento, realize a flexão até 90º e a extensão completa dos joelhos. |